Assim que me despedi
da sala branca e iniciei a descida na escada em forma de rocambole, o segurança
me acompanhou, era um sujeito que lembrava um guarda roupas embutido, feições
de negro e cabelos lisos, sem poder ver-lhe os olhos, que os óculos escuros
escondia, não podia avaliar o nível de violência dele, no entanto, o passo
silencioso e o cabelo cortado em estilo de quartel, denunciavam uma disciplina
de cão treinado, suponho que ele, no momento, também me analisava.
Agora, sem a
expectativa da entrevista e com os bolsos cheios, o jardim me pareceu muito
mais bonito que na entrada, na estátua do romana do centro, uma ramificação de
trepadeiras subia e se encrustava no mármore, flores amarelas nasciam nas
pontas, a rosas multicolores jogavam no ar um odor de flores vivas e borboletas
amarelas passeavam entre elas.
Sem palavras, antes
de fechar o grande portão, o segurança me deu um papel pequeno, um endereço no
Itaim e um nome de mulher, dobrei-o e enfiei no bolso, quando voltei à Corifeu
de Azevedo Marques procurei uma banca de jornal, comprei o Estado de São Paulo,
fazia um bom tempo que não podia comprar um, dobrei-o e enfiei debaixo do braço,
entrei num bar escuro e pedi um copo grande de café com leite.
O português enfiou
os polegares nas tiras do suspensório e, sério, disse:
_. Não temos copos
de café, tampouco de café com leite, nesse estabelecimento, só servimos em
copos de vidro.
_Opá, me serve
também.
Ainda que ele tenha
gritado, não havia qualquer sinal de animosidade na fala dele, na ponta do
balcão uma máquina antiga de café expresso se impunha imponente, ele virou a
torneira e o cheiro inconfundível do liquido escuro tomou conta do ambiente,
encheu um copo americano grande, menos um dedo da borda que, ele completou com
o leite gelado.
Ao jogar o meu café
no balcão, sumiu-se para a cozinha, um pôster gigante tomava conta da parede
central do minúsculo bar, uma imagem gigante, o time perfilado da Portuguesa de
Desportos, na parte do gramado havia uma assinatura...Enéias.
Sorri em pensar que,
talvez eu estivesse a tomar o meu café, na mesma cadeira de um ilustre
personagem da história, segundo depois me vem o portuga com um cestinho cheio
de bolinhos de bacalhau.
_. Para mim???
_. Estás a ver mais
alguém???
Ah, esses
portugueses e seu jeito atropelado de cavalheirismo.
A viajem era curta até
o centro, mas daria para uma boa leitura, abri o jornal e as pessoas que
estavam em pé no corredor do ônibus se atentaram na leitura também, as notícias
descreviam um mundo novo:
Mikhail Gorbachev
dava os últimos golpes na já finada União Soviética e a Pastoral de Dom Paulo
Evaristo representava os detentos do Carandiru.
Enfim, um problema
novo e um bem velho, o mundo estava mudando.
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